05 outubro 2007

Os Aforismos de Pan - III

Nada é tão frágil e tão forte quanto o homem: um germe pode abatê-lo, mas há nele uma natureza de fênix, que o faz ressurgir sempre.

O coração é um órgão de um outro sentido, além dos cinco conhecidos, o sentido humano do todo: não ilações racionais nos ligando a outros entes, mas um sentir, uma percepção hiper-orgânica de que há um todo, de que assim como do coração partem veias e artérias que tornam o corpo um todo orgânico, também o é assim em relação aos seres, fios invisíveis ligam o macro e o micro, os seres, o coração do homem, dos animais e do cosmos. Há um sol em cada coração, há um coração em cada ser. O coração é a verdadeira flauta de Pan.

A morfologia animal revela o percurso pelo qual a espécie passou, mas revela também a assimilação dos mecanismos adaptativos e de defesa. É como a cabeça da barata doméstica, onde, vista por cima, se parece um grande olho, que deveria ter a função de afastar certos predadores. Como deve ter sofrido essa pequena criatura para poder chegar até aqui.

Viver é uma eterna auto-combustão. Somos cinza e chama. Sem fim.

Se o espelho reflete a nosa imagem, o reflexo do que somos, não há melhor espelho que o das águas: muito mais do que corpo, somos água, somos peixes em busca do nosso rio de origem.

Hipocampos cruzam prados de mar e traduzem a lição do sal: vida é transição.

A memória do amor tem sede no coração. Quando se ama, o coração espalha pelo sangue fragmentos do amor, da pessoa amada: uma palavra dita, um momento compartilhado, de modo que cada célula do corpo traz em si o rosto do amor. Quando lembramos de alguém que amamos, lembramos com todo o corpo.

O amor cresce no tempo. Diferente do caráter episódico da paixão, que se satisfaz com a consumação imediata, o amor cresce à sombra do tempo, das provações, das demonstrações ao longo da vida. O amor não teme o tempo.

Nada me causa mais repulsa do que o dinheiro. Bancos são como campos devastados por uma hecatombe nuclear : áreas estéreis onde a vida se recusa a nascer, onde a vida se recusa a entrar.

Foi uma quase vitória do capitalismo fazer crer que ele é somente uma consequência da natureza, fazer crer que o dinheiro é essencial para a civilização. Será uma vitória da inteligência provar o contrário.

O cosmos se desenvolve por expansão gnomônica: de um núcleo original partem as formas dos universos, reprodução desse núcleo primeiro em diferentes níveis e assim sucessivamente numa expansão contínua. A chave para a expansão gnomônica do cosmos é o aforismo de Hermes Trismegistos que diz: Tal como é em cima, é em baixo. É por isso que a proporção de água presente na célula, no corpo humano e na terra é a mesma, 70%, e é por isso que nos dedos trazemos as mesmas espirais das constelações: o homem é também um universo.

Quando o espírito se agita ainda há esperanças. O espírito só silencia quando sabe que nada pode realizar.


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