01 setembro 2007

Dois Poemas

Amor Fati

Lavei dos olhos toda areia
planetas escorrendo em lágrimas
claridade das claridades ante mim:
amo-te, vida
amo mesmo meus amores desafortunados
meus horizontes frios
e teu amor obscuro
amo as mulheres de olhos negros
todos os cabelos
todos os sorrisos
todos os desvelos
todos os sóis, ventos horizontes
toda rubra luz, todos os montes
que surgem na aurora dos tempos

amo-te bella femina
cheia de mistérios

aguardo sempre na ribalta
as cortinas se abrirem
e te ver surgir sempre:
outra vez.


Canto em Fragmentos

I

Dunas estreitas de silício à frente
de nosso coração aberto
a vida vem em sal e feno
em sol de trevas e esperança
caminhamos e somos fragmentos
nossa voz, coda
nossa mão, espada
que tira a palavra
da pedra bruta que a guarda
dias em que fui silêncio de mármore
luz no punhal suicida
dias de caminhar alegre em outros Saaras
além do coração

mar à vista, a vida
sempre tão bela quanto
no ínicio da viagem


II

Não há cartas-portulano com os amigos
nem a noite
nos guiará pelo seu véu de estrelas
somo o que de nós fazemos
somos a bússola e nosso próprio guia.


III

Estrelas oblíquas num mar de feldspato
vim de uma terra onde não havia mais ninguém
homens de metal fundiam-se ao sol do passado
na muda vastidão de outros confins
vim de uma terra onde não havia mais ninguém

terra desconhecida de homens-pássaros
terra desconhecida de cítaras e magmas
curvas de basalto no olho do vulcão
oh terra estranha de áspero amor
por ti deixei a solidão, os cântaros do passado
vim de uma terra onde não havia mais ninguém
pela promessa de teu horizonte vertical

Terra de plantas e espadas
terra de gelo e canções ciganas
trago-lhe de mim os fragmentos
oferendas dispersas pelo tempo
pois vim de uma terra
onde não havia mais ninguém.


IV

Não somos a angústia do eclipse
pedra de mosaico em meio à multidão
nossas pupilas traem os segredos do mundo
somos arautos do que não se anuncia
angústia da beleza presa no mármore
da palavra engastada em algum diapasão:
seja nossa voz sopro de letras
cinzel de flores a libertar a fala

a viagem desdobra-se como lençol de nuvens
astros espalhados no imenso:
pedaços de nós
terras abandonadas, amores guardados
em malas vazias:
dunas de silêncio, praias estreitas
dias de ser aurora, sempre
pois vim de uma terra
onde não havia mais ninguém.


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