08 setembro 2007

Dois Poemas, um em prosa

Autógeno

Tua boca emergiu na primavera
quando os galos anunciavam
diferentes auroras

do vácuo entre estrelas
teu alento
cortando o espaço

abrias clareiras no tempo

longe de ti, também roubamos fragmentos da eternidade
miríades de palavras
turbilhões de sentidos

para renascermos sem deuses
glorificarmos o presente
fomos terra e semente
para sermos mais que
humanos.


Terra
Nem tudo o que desejo é cósmico, nem tudo tem asas nos pés: quase sempre um cheiro de terra, folha molhada, vapor d'água, suor, pulsações, suavidade.
As hexagonais das teias de aranha reproduzem as vibrações das borboletas; no lugar do silêncio, murmúrios, gritos, sussurros, de criaturas sob as folhas secas, de cópulas nos galhos das árvores, de festas sazonais.
Porque sou floresta não posso silenciar a noite - quando estou escuro, sou arena de caça, muitos vão e vem, hordas de piratas e um exército sem nome; há mil dias nessa noite, mas o sol não se põe.
Estar sozinho é não escutar quando amanhece o sol, é não ouvir a glossolalia da luz, que fala ideogramas escuros: homem sentado, uraeus, pilar erguido - eis que vem a companhia...
Senhor dos mortos, senhor dos subterrâneos, nem tudo o que desejo é cósmico, bastam flores, o aroma do sexo das mulheres, as essências olorosas banhando o falo da terra.
Não estamos sós - deciframos sinais nas pedras, desenhos nas costas das montanhas, raios iluminando a noite - tudo é voz quando se pode ouvir.
Sob um casulo, brotava um cosmo. Tenho olhos de nitrato de prata: tudo o que é terra é luz.

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